Artigo na Revista Exame – Ray Kordupleski

No final dos anos 80, a AT&T realizava cerca de 60.000 pesquisas por mês nos Estados Unidos para medir a satisfação de seus clientes. O índice de aprovação, de 95%, só causava alegria. Apesar disso, num único ano a empresa perdeu 6 pontos percentuais de participação no mercado. Cada ponto representava 600 milhões de dólares a menos no caixa. Como podiam perder clientes se a esmagadora maioria dizia estar satisfeita? Estudando as pesquisas, a AT&T percebeu uma série de falhas. As avaliações “bom” e “excelente”, por exemplo, eram somadas. Mas 40% dos clientes que avaliaram a AT&T como “boa” estavam dispostos a trocar de empresa de telefonia.

Na época, o engenheiro Ray Kordupleski era diretor de qualidade e satisfação do consumidor de uma das unidades da AT&T. Ele acabou se tornando um dos pioneiros no desenvolvimento do conceito de gerar valor ao consumidor. Depois de 29 anos atuando na indústria de telecomunicações, em 1996 criou a CVM (customer value management), que desenvolveu uma metodologia própria, a CVA (customer value added, algo como “valor percebido pelo cliente”), para medir o que de fato importa ao consumidor. Entre os seus clientes, estão hoje empresas como Johnson & Johnson, Nortel, British Telecom, Disney, Dow Química e Chase Manhattan. No Brasil, a Multibrás e a Philips adotam essa metodologia. A Multibrás, nos anos 90, perdeu 20 pontos percentuais em suas vendas de Brastemp e Consul, e a CVA ajudou-a na recuperação – um caso que está no livro Mastering Customer Value Management: The Art and Science of Creating Competitive Advantage (numa tradução livre, “Excelência na gestão de valor ao cliente: a arte e a ciência de criar vantagem competitiva”), lançado em abril nos Estados Unidos. Kordupleski esteve em São Paulo neste mês para uma série de palestras. Veja os principais pontos de sua teoria:
NÃO BASTA FALAR
EM CRIAR VALOR

 

“Praticamente todas as empresas abordam a vantagem competitiva em seus relatórios. Por que não obtêm resultados? Porque são só palavras. As empresas Não possuem mecanismos para efetivamente medir a geração de valor ao cliente. Alguns dizem que isso não é tangível, mas é. O que desenvolvemos na CVM é uma metodologia para não só analisar os produtos e os serviços de uma empresa, mas compará-los com os da concorrência. Além disso, o conceito de valor deve medir a satisfação do cliente não apenas em relação ao serviço em si como também em relação ao preço que ele pagou.”
O FOCO É O CLIENTE,
NÃO O ACIONISTA

 

“As empresas sabem que o dinheiro vem dos consumidores, mas, como o foco está nos acionistas, acabam não pondo a energia necessária nos clientes. Há vários programas sendo adotados, como o CRM e o Seis Sigma, mas eles isoladamente não medem a satisfação de valor gerada, apenas a satisfação em relação ao produto e ao serviço oferecidos, sem comparações. As pesquisas de satisfação do consumidor são falhas porque não perguntam se ele está feliz com o custo-benefício. É muito comum os executivos perderem o sono por causa dos balanços financeiros, não por causa do consumidor. Deveria ser o contrário.”

NÃO BASTA PERGUNTAR
SE O CLIENTE GOSTA

“O mais importante é entender quem toma a decisão de compra e o que é fundamental para que esse consumidor se torne fiel. Uma falha comum é que são feitas pesquisas separadas para analisar imagem e preço. Também é freqüente os dados dessas pesquisas ficaram nas mãos do pessoal de marketing e comunicação. Essas informações têm de pautar o trabalho desenvolvido em toda a cadeia de produção, venda e pós-venda. Outro procedimento muito adotado é primeiro traçar um plano estratégico para o ano seguinte e depois realizar pesquisas. Na verdade, as pesquisas é que deveriam apontar o que é possível traçar como meta.”

NÍVEL “BOM”
É RUIM

“Trabalhei em todos os continentes, com exceção da África, e a minha experiência mostra que, em média, 40% dos clientes que avaliam o seu grau de satisfação como ‘bom’ estão dispostos a considerar outras ofertas. Um grande erro cometido freqüentemente nas pesquisas é somar as respostas positivas, como bom e excelente. A lealdade, porém, só parte dos consumidores que se dizem extremamente satisfeitos. A zona de conforto gerada pela soma das avaliações positivas é particularmente perigosa para os líderes de mercado, que têm a chance de perder mais clientes.”

CLIENTE FIEL
NÃO SIGNIFICA RENTÁVEL

“Nem todos os clientes fiéis são rentáveis, e vice-versa. É importante que a empresa se empenhe em criar mais valor àquele cliente que traz mais retorno ao acionista. Há casos em que a empresa quer criar valor a todos os clientes e não consegue obter lucratividade em nenhum segmento. Eu, por exemplo, acumulo cerca de 150.000 milhas por ano em programas de milhagem de companhias aéreas. Vôo basicamente por três companhias aéreas, mas concentro minhas viagens em duas. A terceira, porém, apesar de eu não ter atingido a pontuação necessária para ser um cliente vip, enviou-me um cartão de afinidade considerando-me como tal. Ela entendeu que a definição de lealdade não significa exclusividade nem se baseia apenas em quanto eu gasto com elas, mas em quanto eu posso gastar.”

O QUE A CVA PROMETE

“A CVA, nossa metodologia, mede com precisão indicadores que permitem fazer simulação, por exemplo, de como determinada mudança no produto ou no serviço vai impactar na participação de mercado. Ela dá aos executivos financeiros os indicadores que eles sempre quiseram, ou seja, quais pontos do negócio podem gerar impacto nas receitas, evitando também desperdício de investimento.”

NÃO FOQUE O RESULTADO,
FOQUE O VALOR

“Uma vez perguntaram a Einstein qual era o segredo para o sucesso. Ele respondeu que não devemos nos empenhar em ser pessoas de sucesso, mas, sim, pessoas de valor. O gerenciamento de valor ao cliente é isso. É não focar o resultado final da companhia, mas a criação de valor ao cliente. O que o CVA oferece é uma metodologia que permite mensurar os caminhos de como chegar lá. A técnica para isso não é difícil de ser implantada. O difícil é mudar a mentalidade das pessoas, fazê-las entender que sua função, seja ela qual for, tem de estar voltada para o cliente.”